3ª Turma do TRT-RS entende que cláusula de quitação irrestrita viola direito de ação e que acordo extrajudicial pode ser homologado parcialmente
A 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) confirmou sentença do juiz Almiro Eduardo de Almeida, da 2ª Vara do Trabalho de Santa Cruz do Sul, que homologou parcialmente um acordo extrajudicial celebrado entre um trabalhador e uma indústria de cigarros. O magistrado excluiu do ajuste a cláusula que daria quitação total do contrato de trabalho, chancelando apenas as parcelas discriminadas expressamente.
Diante do entendimento do juiz, a empresa e o trabalhador apresentaram recurso ao TRT-RS, sob o argumento de que não haveria possibilidade de homologação parcial, apenas a rejeição total do acordo ou a chancela do ajuste na íntegra.
Ao analisar o caso, o relator do processo, desembargador Alexandre Corrêa da Cruz, argumentou que a cláusula de quitação total em acordos extrajudiciais fere princípios constitucionais, já que elimina a possibilidade de acesso à Justiça caso o empregado descubra posteriormente ter sido lesado durante o contrato.
“A pretensão de homologação de acordo extrajudicial em que se propõe a quitação geral relativa ao contrato de trabalho configura inegável prejuízo ao trabalhador, por caracterizar a renúncia de direitos básicos, afetando, em especial, o direito fundamental do indivíduo ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF/88), ou seja, de buscar a tutela jurisdicional de eventuais questões sobre as quais surjam controvérsia”, escreveu o relator.
Segundo Corrêa da Cruz, o empregador possui mais condições de apurar se o contrato foi integralmente satisfeito. Além disso, conforme o relator, o acordo extrajudicial, que em um primeiro momento poderia ser considerado benéfico ao empregado, já que possibilita o recebimento rápido do montante ajustado, poderia impedir que outras parcelas fossem cobradas posteriormente, caso o trabalhador descobrisse que teve direitos sonegados.
“A cláusula de quitação geral e irrestrita caracteriza objeto não lícito, pois ofende noções básicas do Direito do Trabalho como ramo protetivo, destacando-se o Princípio da Indisponibilidade, além de contrariar diretamente a garantia constitucional do Direito de Ação”, concluiu o relator, ao defender que, no caso discutido, o processo deveria ser extinto, sem resolução de mérito.
No entanto, para as demais integrantes da Turma Julgadora, desembargadoras Maria Silvana Rotta Tedesco e Maria Madalena Telesca, o acordo deveria ser homologado de forma parcial, como decidiu o juiz de Santa Cruz do Sul. Isso porque, embora as magistradas considerem que a cláusula de quitação geral fere o princípio do acesso à Justiça, a homologação parcial, que exclui essa parte do acordo, seria benéfica ao trabalhador, já que possibilitaria o recebimento do montante acordado, sem qualquer tipo de prejuízo.
O entendimento foi o mesmo a que chegaram os participantes do simpósio “Reforma Trabalhista e Justiça do Trabalho: desafios e perspectivas”, promovido pela Escola Judicial do TRT de São Paulo, cujo enunciado defende que “a quitação decorrente da homologação abrange apenas os valores referentes aos títulos indicados, não tendo abrangência genérica, dado tratar-se de decorrência do ato de homologação do Juiz da causa”.
As magistradas citaram, ainda, julgados de outras Turmas do TRT-RS no mesmo sentido. O processo ainda está na fase de recursos.
Saiba mais
A possibilidade de acordo extrajudicial está prevista nos artigos 855-B e seguintes da CLT, inseridos pela lei 13.467/2017, a chamada Reforma Trabalhista.
Conforme as novas regras, empregadores e empregados podem ajustar acordo entre si e, posteriormente, de forma voluntária, levar o ajuste à análise do Poder Judiciário para homologação ou não. O início do processo de homologação de acordo extrajudicial deve ocorrer por petição conjunta das partes, sendo que cada parte deve, obrigatoriamente, ser representada por advogado. Ao trabalhador é facultada a possibilidade de ser representado por advogado do sindicato da sua categoria. O juiz do Trabalho tem prazo de quinze dias, contados a partir da distribuição da petição, para analisar o acordo, designar audiência caso entenda necessário e proferir a sentença.
Fonte: texto de Juliano Machado